Família Completa

Família Completa
Familia em 27 de dezembro de 2009

Quem sou

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

A PROPOSITO DO NASCIMENTO DO TOMAS

25 de novembro de 2008

A propósito da vinda ao mundo do meu novo netinho Tomás:

Kalil Gibran em sussurros de consolo:

"Vossos filhos não são vossos filhos. São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma. Eles vêm através de vós, mas não de vós. E embora vivam convosco, não vos pertencem. (...) Vós sois os arcos dos quais vossos filhos são arremessados como flechas vivas."

Quando o avião decolou, minha filha foi buscar a sua vida e seus sonhos. E eu precisava conviver com a coerência do que transmitira aos filhos:
O lar não é o lugar de se ficar, mas para onde voltar. Que os filhos sejam preparados para irem-se, com a certeza de ter para onde voltar quando o cansaço, a derrota ou o desânimo inevitáveis lhes machucarem a alma! O salgado das lágrimas se transformou em doçura de conforto. Como pai, não dando o mundo aos filhos, me senti arqueiro e arco, arremessando a flecha viva em direção ao mistério.
Agora a minha filha querida me dá o meu netinho! Mesmo sendo avós, temos, sim e ainda, filhos a criar, pois família é uma tribo em construção permanente...
Pais envelhecem, filhos crescem, dão-nos netos e isso é a construção, o centro do mundo onde a obra da criação se renova sem nunca completar-se.
De guerreiros que foram, pais se tornam pajés. E mães, curandeiras de alma e de corpo. É quando a tribo se fortalece com conselheiros, sábios que conhecem os mistérios da grande arquitetura familiar...

Obrigado minha Pretinha por compartilhar conosco o milagre da vida!!

Papai.

PAPAI

AUGUSTO EDUARDO MONTANDON

Avenor Augusto Montandon
Era um poeta!
Escrevia versos, de grande inspiração, temperados com o romantismo que lhe era peculiar. Tinha uma preferência especial por sonetos.
Era um contemplativo. Admirava e apreciava a natureza, os pássaros em especial, os animais e as plantas. Os crepúsculos o seduziam... Ele sabia interpretar como ninguém o significado das cores, e as miragens deslumbrantes que lhe eram proporcionadas nos finais de tarde. Nas varandas, numa confortável cadeira, fixava o seu olhar perdidamente no infinito, e invariavelmente exclamava elogios áqueles momentos.
Era um homem simples, um curioso, um intelectual. Passou a vida colecionando livros e revistas, que a todos lia. Herdou de seus ancestrais suiços, as habilidades de relojoeiro. Consertava relógios por prazer. Não só os reparava, mas construía as peças, por mais detalhadas que fossem. Relógios antigos? Não os deixava perecerem, esquecidos nos armários de entulhos das casas e fazendas... Recolhia-os como filhos e os ressuscitava, num minucioso trabalho de restauração, da caixa ao mecanismo, que nas paredes de casa passavam lindos, a pulsar harmonicamente.
Seu pioneirismo nas artes fotográficas é inconteste.
Já nos anos quarenta documentava em filmes 8 mm as cenas da família, os passeios, as romarias, as festas, a cidade, enfim os momentos e lugares que deveriam ser perpetuados. Também foi um entusiasta das comunicações. Seu prefixo de radio amador era PY4 GF, sendo onipresente nas “rodadas” dos aficionados desse importante meio de comunicação da época.
Era uma criança crescida, fascinado pela vida, pela família, pela tecnologia incipiente da época. Fazia brinquedos, pipas, carrinhos, aeromodelos, com os quais brincava com seus filhos, que eram “poucos”. Só oito, como sempre dizia. “Se sua mãe quisesse teríamos muitos mais”!! Quando questionado de qual deles gostava mais, respondia: “dos ausentes e dos doentes”.
Aviação? Aviões eram a sua maior paixão!!!
Foi um dos primeiros pilotos a ser brevetado pelo Aeroclube de Araxá, no começo dos anos 40. Entendia, curtia, e participava de tudo o que se referia á aviação.
Era inevitavelmente protagonista das experiências e aventuras aeronáuticas na região de Araxá. Soube curtir o avião - mais glamouroso e mais fascinante que nos dias atuais, não só como hobby e instrumento de maiores emoções, mas também como ferramenta de documentação fotográfica. Deixou importante acervo de fotos aéreas de Araxá e região. Exerceu a profissão de tabelião do 1º oficio de Araxá por mais de 40 anos!!
Augusto: esguio, alegre, religioso e culto, a cada dia louvava a vida!
Eclético e inspirado: o tabelião, o piloto pioneiro, o radio amador, o relojoeiro, o poeta, o romântico, o artista, o amigo, o conselheiro, o exemplar pai de família, nasceu em Araxá no dia 14 de fevereiro de 1913. Casado por mais de 50 anos com Elizena Carvalho Montandon, tinha oito filhos e 20 netos quando faleceu, para tristeza de todos que o conheceram, em 26 de junho de 1990.

RENASCER

RENASCER

História de um médico operado.

Avenor A. Montandon

Fazem exatamente 96 horas que iniciou a minha cirurgia de vesícula- às 9:22 do dia 8 de dezembro de 1989 no hospital Dom Bosco.
Jamais imaginei que um dia eu seria o operado. Acho que se tivesse a exata dimensão da dor e do desconforto eu não teria me exposto a isso. Assentado na sala de casa, sentindo dor nas costas, na barriga e na cabeça, sem posição direito para nada, tendo na resignação esperar que o alívio venha progressivamente na proporção direta do tempo. É preciso descrever para não olvidar. Não esquecer é importante para a minha formação como gente e como médico. O paciente não passa ao médico, e não tem como transmitir o que ele sente. Quantas cirurgias dessas eu já fiz e nunca poderia avaliar olhando e conversando com o paciente o tamanho desconforto e tamanha dor e indisposição. Basta acrescentar o estado de espírito e a coisa então fica enorme. A gente sente como um animal ferido.
O paciente fala, mas você desconfia de outra maneira. Depois, a capacidade de esquecer o sofrimento com o transcorrer do tempo, aliada ao bem estar pela eliminação do mal que o acometia, faz com que fique ligado ao inconsciente indevassável os momentos mais sutis que caracterizavam o evento.
Sempre fui um dispéptico crônico. Desde menino tive intolerância alimentar e alta sensibilidade à bebida e comilanças, vomitava em viagens. Passava mal com 10 copos de chope. nos últimos 20 anos a pirose noturna foi minha companheira inseparável. os antiácidos, pouco a pouco, foram perdendo o seu efeito durável. Só um tamponamento efêmero. Se não fosse pela descoberta mais recente dos antagonistas de hidrogênio, acho que minha vida teria sido impraticável pela impossibilidade de dormir com a dor epigástrica e azia. Procurei as causas. Tinha quase certeza de que possuía uma úlcera péptica incipiente junto com uma gastrite violenta. Procurei conviver assim. Relutei em fazer endoscopia para confirmar. Nós, os médicos somos covardes quando se trata de investigar doenças em nós mesmos. A apreensão em descobrir doenças graves ou imaginar complicações dos exames ou tratamentos nos afugenta da propedêutica. Mediquei a mim mesmo enquanto pude, até que ao retornar ao Rio, em princípios de novembro não me senti bem na viagem. Aqui, após ingerir uma barra de chocolate à noite, fui acometido de violenta dor em cólica no epigástrio que nas duas horas que perdurou, quase me matou. Para mim foi inequívoco o diagnóstico. Estava tendo uma cólica biliar ou alguma outra complicação séria. No dia seguinte, já refeito fui submetido ao ultra-som que foi taxativo: vesícula com cálculos. E para complicar os outros exames bioquímicos revelaram alterações hepática concomitantes com altas taxas de transminases. Fiquei preocupado. Resolvi me submeter à endoscopia realizada numa manhã de sábado no hospital dia 11 de novembro. Surpreendentemente a única revelação - esofagite de refluxo. nada de úlcera, nada de gastrite. Pude então concluir que a não ser pela esofagite a minha doença toda advinha da situação da vesícula. Conversei então com o Dr. Eli, quem me operaria. Ele me recomendou a normalização dos exames e depois quando quisesse me “racharia”no meio. foi uma fase de enfrentar psicologicamente difícil. Imaginar-me operado estava parecendo um pesadelo. Ponderei, enquanto refazia semanalmente os exames de sangue, que prevalecer sem cirurgia era, no mínimo arriscado. Podia ter outras cólicas insuportáveis como realmente tive 2 dias após a 1ª (mais duradoura e mais intensa), podia ter uma obstrução, uma pancreatite, uma colangite e até mais tarde um câncer. Marquei a operação.
Ficou acertado para o dia 8 de dezembro, uma sexta-feira. Queria tempo para me recuperar para as festas de Natal e fim de ano e também aproveitando a calmaria natural do trabalho no mês de dezembro. Iniciar vida nova no ano novo. Começar a nova década desencucado. Os dias que precederam foram estressantes. Acordava à noite sobressaltado, imaginando até o impossível. No dia 8, finalmente, levantei-me às sete, tomei um banho, raspei dos mamilos aos genitais, aparei a barba, fiz a maleta de roupas e fui para o hospital. Às 8:30 fui para a sala onde a equipe (Eli, Marcílio, Edson e Helena) aguardava. usaram monitor por exigência minha. A Helena, muito acadêmica se propôs a fazer uma peridural com cateter concomitantemente com a geral para permitir com injeção de morfina um ponto mais confortável. Não vi nada a partir do momento que me injetaram o hipnótico. Só tive noção de coisas horas depois que voltei ao quarto. Permaneci com analgesia até o dia seguinte, mas advieram, é claro, as complicações: soluço incontrolável e retenção urinária séria. Forcei vômito onde eliminei enorme quantidade de liquido de estase preto e grudento como se fosse pixe. Dormir foi impraticável, não obstante as drogas. O desconforto era total. Se estivesse sentindo a dor acho que teria morrido. Eu mesmo tentei passar a sonda vesical, uma bobagem, e ardeu tanto que fiquei com ela pouco tempo. Tive que tirar sem drenar toda a urina. Aliada ao soluço, uma alergia manifestada por uma coceira alucinante no nariz que cedeu com fenergan injetável.
Queriam que continuasse sem urinar com hidratação parenteral. Recusei-me. Disse que só tomaria o soro quando normalizasse a urina. O soluço só passou 24 horas depois da operação, bem como a retenção. Como seqüela do soluço fiquei com uma dor diafragmática insuportável que parecia torcer o esôfago ao eructar. Isso me impediu simplesmente de dormir a 2ª noite. nessas alturas, a dor já estava com a corda toda e apesar de tomar remedinhos não cedia. Pedi remédios fora da prescrição que me foram dados até por ignorância da enfermagem e do plantonista com o 1º banho e a 1ª evacuação. 48 horas depois da cirurgia me senti melhor. Muitas visitas me impediram até de descansar mais, porém, a verdade é que a falta de posição para assentar e deitar é que eram os fatores mais importantes. No dia 11, segunda-feira, tive alta. O Eli conversou comigo como se fosse um leigo. A Cecília e Sancho que foram meus companheiros de quarto me transportaram para casa (Cristian estava viajando para Barbacena nos exames médicos da EPCAR). Aqui em casa, me senti mais confortável. Minhas funções parecem normais. Pude ver o filme com toda a cirurgia, filmado pelo Zé Augusto. Agora, 96 horas e 10 minutos após terminada a cirurgia me recupero. E tiro daí grandes lições:
- Não somos melhores nem piores que ninguém.
- Somos míseros mortais prestes a ceder espaço a qualquer momento nesse mundo.
- O limiar da dor não pode ser traduzido em palavras.
-Muitas das complicações como estase, alergia, retenção urinária e até uma hipersensibilidade na face externa da coxa deveram-se à anestesia complementar dispensável.
- A vida é importante, mas só tem sentido se somos fortes para ter coragem de decidir e suportar as conseqüências.
- A tolerância é uma virtude imensurável. Acho que o nível social e cultural é inversamente proporcional à capacidade de tolerar.
- Somos totalmente impotentes diante dos fatos consumados, onde os valores pressupostamente importantes caem por terra.
- A vida é como diz o poeta : um eterno renascer...


Araxá , 12/12/89
19 anos completados, hoje que recebi o diploma de médico! (UNB 1970)

RECADO AO MEU FILHO

RECADO AO MEU FILHO

Avenor A. Montandon

Filho meu, peço-te perdão.
Peço-te perdão, porque por culpa minha nascerás. Num momento de paixão, misto do meu amor por tua mãe, compartilhei com o mistério da natureza e foste concebido. Nascerás em algum tempo. Enquanto mesmo estiveres no ventre de tua mãe já sentirás os reflexos da hostilidade do mundo que em pouco tempo passarás a habitar. Tua mãe, no entanto, proteger-te-á e tudo evitará para que o sofrer lhe seja ameno, e, teu pai apoiará este gesto no instinto paternal que carrega.
Quando cumprires o tempo de vida parasita e de tua mãe apartares, ainda franzino e muito frágil, passarás a habitar o mundo de teus pais. Logo sentirás quão frágil és diante dos adversários teus. Mas, teu pai, tua mãe, tudo farão, estejas certo, para suprir essa fragilidade. Tomar-te-ás forte e superarás as dificuldades todas que se impõem à existência.
Filho, peço-te perdão, porque habitar esse mundo é sinônimo de sofrimento. Nascerás de uma espécie má.
Teus semelhantes, dominados pelo orgulho, inveja, ambição, insistem em hostilizar-se entre si. Poluem o ar, a terra, as águas. Destroem criaturas de incontestável beleza e pureza à satisfação do instinto de crueldade.
Exterminam as plantas, que verás são lindas; dão flores, estruturas de perfeição infinita em beleza, aroma, cor. Dão frutos, alimento rico e saboroso, símbolo de prosperidade; dão sombra, onde o frescor abranda o espírito e acalenta a alma.
Matam os animais, erradicam espécies que a natureza gastou milhões de anos para construir, animais que se mantidos, só tornariam a vida do homem mais bela e abundante em graça e alimento.
Quebram com essa destruição e poluição o equilíbrio ecológico, promovendo a revolta da mãe natureza, que cria os conflitos naturais: grandes variações climáticas, tempestades cataclísmicas, arrasadoras que ao homem mesmo destrói como se rebelasse contra as atitudes impensadas do único ser pensante.
Peço-te perdão meu filho, porque o homem cria mais armas a cada dia, incrementa e estoca poderes destrutivos, que em poucos segundos tornaria o nosso planeta uma chama, com substrato inerte, e a loucura coletiva, motivando a apenas um homem, poderá desencadear esse alto poder destrutivo que acabará por deixar no nosso planeta, poucos testemunhos da beleza que outrora existiu.
Hoje, meu filho, o mundo gira, movimentado mais pelo pecado e pelo dinheiro que pelo amor e fraternidade. Morrem aos milhares os nossos semelhantes, de fome, de miséria, de epidemias, enquanto sociedades riquíssimas esbanjam e mais querem obter.
Peço-te perdão mais uma vez, meu querido e desejado filho, porque a minha ambição é grande em querer-te; peço-te perdão porque, mesmo sabendo de todas as condições hostis que encontrarás ao nascer; mesmo sabendo que tornarás pela convivência mais um na espécie; mesmo sabendo que é provável que pouco viveremos, que encontrarás um mundo cruel e feio, poluído, imundo e fétido, eu o deixarei nascer, e mais que isso eu te amo, muito desde agora, e mais quero ver-te ao meu lado, e como teu pai, ciente de tudo, experiente em tudo, procurarei fazer que tudo te seja menos feio, tudo menos grotesco e paradoxal.
Perdoe-me agora meu filho, mas venha logo para nós. Eu e tua mãe ansiosos te aguardamos aqui no teu lar.


Três Pontas- Março / 1974

CABOCLA

Cabocla

Avenor A. Montandon

Ao ver-te assim tão linda
Busco na distância o meu consolo
E embora, ter sentido tudo isso,
Há tanto tempo, te desejar e te querer
Só agora posso te-la no meu colo!

Olho você exuberante, radiante,
Mostrando a alma, o coração,
Um corpo como a mais bonita canção!
Formas, curvas, suavemente desenhadas, arrojadas,
Despojadas, se mostrando eloqüentes na atração!

Seu cheiro de flor, uma harmonia! uma cor!!
Só um homem cego não morreria de amor!!
Simples, natural, rústica, do campo,
Brotada do chão como uma planta
Por maior inspiração do Criador.

Querer-te mais não poderia!
Corpos possuídos, suados, exauridos..
Apenas sentem, sonham e sofrem
Não nos pertencem, e a despeito do amor,
O tempo, a distância, nos afasta e nos consome...
E nos arranca da alma esse louco alimento, essa chama,
Que só poderiam pertencer a quem ama!!

CURRICULUM VITAE SUMÁRIO

CURRICULUM VITAE SUMÁRIO


AVENOR AUGUSTO MONTANDON

Nascido em Araxá em 3 de janeiro
Filho de: Augusto Eduardo Montandon
Elizena de Carvalho Montandon
Casado com Maria Cecília Spinola Montandon em 1972.

Filhos: Cristian Augusto Spinola Montandon (Sacerdote)
Sancho Spinola Montandon (Casado com Juçara Alves Montandon)
Nicole Spinola Montandon (Casada com Carlos Hernan Contreras)
Andrei Spinola Montandon
Fernanda Caroline Montandon

Netos: Lucas Augusto Alves Montandon
Matheus Augusto Alves Montandon
Arthur Augusto Alves Montandon
Tomas Contreras Montandon
Santiago Contreras Montandon
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Médico formado pela UNB (Brasília) em 1970.

Internato em Cirurgia na Fundação Hospitalar do DF.

1º tenente médico da Marinha (2 anos)

Secretário de Estado da Saúde - Amapá 74/75

Especialista em Saúde Publica pelo Instituto Castelo Branco da Escola
Nacional de Saúde Publica – Rio de Janeiro (1 ano).

Residência médica em Cirurgia Geral – Hospital Getulio Vargas (Estado) e Hospital de Ipanema (INAMPS) Rio de Janeiro (3 anos).

Titulo de especialista em Cirurgia Geral

Assessor do Ministério da Educação – Brasília.

Assessor médico da DATAPREV – Rio de Janeiro.

Diretor de Departamento e Secretario Adjunto de Planejamento da Direção Geral do INAMPS – Rio de janeiro – (3 anos).

Membro de Comissões interministeriais que planejaram e implantaram a reforma sanitária Brasileira que resultou no SUS.

Responsável pela implantação do Sistema AIH no Brasil

Chefe do Serviço de medicina social do INAMPS – Araxá 1985/86.

Vereador pelo PFL – Araxá - (1997 / 2000).

Professor de Medicina Aeroespacial da Universidade de Uberaba - UNIUBE

Superintendente do IPREMA (INSTITUTO DE PREVIDENCIA MUNICIPAL) – Araxá (2001 / 2004).

Medico cirurgião / obstetra – Santa Casa e Hospital dom Bosco – Araxá (25 anos).

Diretor Clinico da Santa Casa – (4 anos).

Diretor técnico da Santa Casa – (2 anos)

Presidente do Aeroclube de Araxá (4 anos).

Presidente da Sociedade de Medicina e Cirurgia de Araxá – (2 anos).

Ex-Presidente do Diretório Municipal do Partido Verde (PV) – Araxá.

Chefe de Departamento da Secretaria Municipal de Saúde (2006/7) - Araxá.

Diretor Técnico da Santa Casa de Araxá

Presidente da Câmara Técnica de Saúde – Secretaria Municipal de Saúde de Araxá

Vários artigos publicados.

Curso de Fisiologia de vôo pelo Centro de Medicina Aeroespacial – CEMAL

Membro do Conselho Nacional da Associação Brasileira de Ultraleves - ABUL

Médico credenciado do DAC/ANAC para exames de PP - há 12 anos

Autor do livro MEDICINA DE AVIAÇÃO – Fisiologia de vôo – Publicado pela UNIUBE em Set/2009

Piloto Privado

Condecorações: Medalha Santos Dumont - Grau Ouro
Medalha Fernando Almeida (ABUL)


Araxá, 16 de Novembro de 2011

Avenor Augusto Montandon

PERGAMINHO DE MELGAÇO

PERGAMINHO DE MELGAÇO

Avenor A. Montandon

Bom Jesus (GO), 11 de Setembro de 1989.
Aguardo num quarto de um simples hotel nesta cidadezinha goiana o momento de voltar a ligar para Sta. Helena de Goiás a 100 km daqui em direção noroeste para saber se deram noticias de onde estão e a que horas chegarão da pescaria no Pantanal, o Sebastião (Dr. Sebastião das Perdizes), seus amigos Julinho e Augusto, seu irmão Neneu seu filho Rodrigo, meu filho Sancho e Sr. Joaquim que estavam comigo no inicio da viagem há 4 dias. A ansiedade me domina, meus nervos estão à flor da pele. Noticias de meia hora atrás ainda muito superficiais falam em problemas com pneus em Rondonópolis a mais de 600 km daqui. Não entendi bem mas como há mais de 8 horas cheguei aqui no caminhão com o freezer e o barco e tendo saído juntos de Barão de Melgaço ontem às 14 horas, algo mais deve ter acontecido. Serviu pra me deixar menos tenso essa noticia pois nestas horas a gente só pensa no pior. O pesadelo parece ainda não ter terminado. Só terminará quando puser meus pés a salvo na porta de minha casa em Araxá.
Tudo começou no dia 6 quando dei inicio à viagem que havia sido planejada há mais de 3 meses. Mesmo sabendo que é difícil, sacrificante e dispendioso esse tipo de programa, resolvi concretizá-lo apesar de ter sido assaltado por maus presságios no últimos dias. Contornei problemas com plantões, arrumei minhas coisas, aticei o Sancho e o Sr. Joaquim e finalmente saímos às 12 horas, no meu carro, um monza branco 1982.
Ficamos de encontrar com o Sebastião em Perdizes e o fizemos cerca de 1hora depois (erramos em 10 km a entrada para o sitio Daniele).
Feitos os acertos, ficamos de nos reencontrar em Uberlândia, mas a 50 km mais à frente o meu pára-brisa foi estilhaçado por uma pedra lançada de um caminhão. Foi uma explosão impressionante e os estilhaços forraram o interior do carro, e os nossos colos. Alguns passaram pela minha testa e braços e provocaram ferimentos que sangraram. Logo em seguida o Sebastião chegou e após removermos os estilhaços prosseguimos até Uberlândia. Confesso que ali tive vontade de retornar para casa, mas seria uma covardia e uma tremenda frustração de todos, principalmente do Sancho que manifestava nos olhos evidente empolgação.
A viagem se atrasou em mais ou menos 2 horas quando repusemos o pára brisas. Combinamos então seguir juntos até à noitinha, e cerca de 100 km à frente, paramos num posto para tomar algo. Devia ser umas 19 horas. Resolvi tomar mais um guaraná e o Sebastião saiu na minha frente uns 5 minutos. Já escurecendo, ouvindo os Beatles, senti o carro estranho, foi como se tivesse desligado algo.
Estacionei no acostamento e tomado de uma ansiedade enorme tentei em vão fazê-lo funcionar. Fizemos sinal e uma camionete parou. O motorista propôs nos rebocar até Bom Jesus a mais ou menos 15 km dali. Providencialmente havia trazido uma corda grossa de nylon e deu certo. Pouco depois o nosso amigo desconhecido nos deixava à porta de uma oficina mecânica prestes a fechar. Para aumentar o transtorno o veredicto foi trágico. A correia dentada havia sido avariada e estourou o cabeçote do motor: conserto para dois dias, se achasse as peças! O mecânico esguio, claro de aspecto confiável foi taxativo: nos deixaria no hotel próximo e no dia seguinte tentaríamos achar outro cabeçote, etc.
Para mim a viagem estava encerrada ali, mas precisava avisar o pessoal que seguira à nossa frente para Santa Helena. Recolhemos o carro e o Maurino (mecânico) nos trouxe no hotel (Diplomata – o melhor da cidade – sem telefone, sem ar condicionado, e os sanitários eram no corredor). Deixamos o Sancho e o Joaquim e saímos para tentar o telefone do posto Cinqüentão em Sta. Helena onde tínhamos programado nos encontrar. Telefones em pane! Restava ir até lá – 100 km! O Maurino se propôs a ir. Estava cansado e sujo e pedi ao Sr. Joaquim para acompanhá-lo. Viemos eu e Sancho para o hotel, comemos algo, vimos televisão, tomamos banho e ansiosos com a volta deles não dormi direito. Afinal haviam passado mais de 3 horas do horário programado do encontro.
Às 2 horas da manhã chegaram. O Sebastião tinha voltado e foi categórico – Sem nós ele não prosseguiria viagem.
O Maurino (imagine!) se predispusera a nos levar no seu carro! De graça! Pagaríamos as despesas. Achei aquilo tudo uma loucura! Ressuscitei meu entusiasmo das cinzas, juntei os cacos e naquela mesma hora saímos. O Sancho foi com o Sebastião. Eu e Joaquim passamos nossa bagagem para o carro do Maurino (um Fiat 147). Coube quase tudo. Deixamos poucas coisas para traz. Maurino levou sua mulher, uma atendente de enfermagem de nome Nilda, para lhe fazer companhia na volta. E a loucura prosseguiu...
Fiquei por entender porque o Maurino faria aquilo. Não era 50, 100 ou 200 km. Eram mais de 800 km! Qualquer coisa como a distância entre Araxá e Rio de Janeiro! Sem falar num detalhe: A estrada em grandes trechos nos apresentaria em péssimas condições e o movimento das carretas era coisa de louco!
Vínhamos à vista uns dos outros, parando ocasionalmente. Consegui tirar poucos cochilos. Almoçamos todos em Rondonópolis, num posto chamado Trevão. Ali me propus dirigir para o Maurino que não havia pregado o olho. O Sebastião saiu na frente e eu me mandei sem saber que rumo tomaria. Todos no carro dormiram. Para meu desespero total, depois de andar 130 km, inclusive em trechos sem asfalto, vi a primeira placa indicativa: “ BEM VINDO AO MATO GROSSO DO SUL” , Coxim X km, Campo Grande X Km. Tinha pego o caminho errado!
Quase fiquei louco! Imagine, com todos os reveses, o cansaço a vontade de chegar, mais 270 km até o destino, sendo os últimos 70 km de terra e eu tendo errado cerca de 260 km! Deu vontade de morrer. Era muito azar!. Alucinado, todos perplexos, virei para traz. Cada km era uma eternidade. O pesadelo continuava. Finalmente, 2 horas e meia depois, de volta ao Trevão. Passamos direto, agora para Cuiabá. Já escurecia quando chegamos a Barão de Melgaço.
Estávamos todos tensos e extenuados. Aquele trecho de estrada de terra, cheio de trepidação, pedras e curvas parecia o ultimo reduto da ansiedade que nos dominava. O Joaquim queixava câimbras e sentia-se muito mal. As rugas em todos, à exceção da Nilda, gordinha e baixota, nascida no Rio Grande do Norte, pareciam mais acentuadas. Não chegava nunca. Só de pensar na volta do Maurino (queria sair de volta logo que chegássemos), aumentava a minha angustia. Para completar o drama um pneu estourou. Cansados trocamos. Voltamos à luta. Faltava mais ou menos uns 20 km ainda.
Quando estávamos por anunciar as luzes de Melgaço, talvez uns 2 km, outro pneu furou. Aí, sem estepe, me propus chegar a pé para pedir socorro. Foi o que fiz. Cheguei a pé em Barão. Mal pude admirar a cidadezinha simpática que se escondia entre as montanhas e o Rio Cuiabá. Vivendo praticamente da Indústria pesqueira tinha ruelas estreitas e tortuosas.
Fui até a pensão do Aparecido onde nos encontraríamos. Lá me disseram que haviam ido a um restaurante. Eram 8 horas da noite quando os encontrei banhados e alegres tomando cerveja e comendo iscas de pintado como “tira gosto”. Acionei o socorro e parti para uma ansiada cerveja.
Fomos todos deitar cedo. Convencemos o Maurino a dormir e voltar no dia seguinte cedo. Era previsto que sairíamos para a pescaria às 7 horas da manhã. Iríamos em 2 barcos. Ao todo éramos 10 adultos com o barqueiro (Ricardo), 2 crianças – Sancho e Rodrigo. Até 9 horas não havíamos reunido para deslanchar a viagem de 90 minutos rio abaixo. Um dos motores havia tido problemas e por isso só às 13 horas embarcamos.
Já tínhamos comido e bebido. Aliás o Sebastião estava caindo de bêbado. Cerca de 40 minutos rio abaixo, esquecidas as adversidades e admirando a natureza já um tanto sofrida pela ostensiva exploração, o tal motor apresentou defeito. A hélice “patinava”. Parecia que o pesadelo não havia acabado. Não hesitamos em retornar. Afinal como prosseguir com um só barco?
Um barco rebocou o outro. Na medida que subíamos de volta íamos pegando “carona” noutros barcos para aliviar o peso. Eu e o Sancho fomos quem primeiro atracamos de volta a Melgaço. Era final da tarde. O 1º dia de pescaria fracassara! Restava-nos a esperança do sábado. Combinamos fazer duas viagens até as baías no dia seguinte. E isso foi feito. Só que, sem barco, que voltara para buscar o resto da turma, não pudemos pescar. Ninguém pescou, a não ser algumas piranhas na margem do rio. Principalmente o Sancho. O segundo dia terminou sem pescaria! Voltamos ás 18 horas a Barão. Exaustos deitamos cedo.
A pensão do Aparecido, simples, quase miserável, sem conforto, não tinha água quando chegamos! Tivemos que tomar banho noutra casa. Restava-nos preparar a volta, prevista para Domingo de manhã. Eu e Sancho “desmaiamos” às 9 horas.
Toda a manhã de Domingo foi movimentada aos preparativos da volta. Saímos para comprar peixes!. Comprei 2 dourados e 1 pintado de 5 kg. Foi um rolo pra sair. Prevista para as 10 horas, sob um calor de 40° saímos às 14 horas. Eu vim no caminhão (F1000), o qual ajudei a carregar com freezer, caixas com motores, bagagens e o barco. Os demais, citados acima, viriam em seguida na belina do Sebastião.
Não havia lugar para 4 na cabine, principalmente porque o Cidão e o Betão pesavam mais ou menos 110 kg cada um e o Alberico, do meu corpo. Nos próximos 70 km de estrada, até passar a poeira, vim na cabine assentado com meia popa sem encostar. Daí pra frente passei para a carroceria, entrando entre o barco e o freezer sobre o qual estendi um colchonete. Era preciso tirar 2 malas e entrar arrastando entre a bagagem. A distância entre o fundo do barco e a superfície do freezer não era mais que 60cm. Ali completamente isolado, em meio ao pó, fumaça e a tralha toda eu tentei me acomodar. Não dava para assentar.
Como um astronauta mal instalado, pobre, sujo e miserável fiquei me virando de um lado para outro com a cabeça sobre uma mala, tentando em vão vedar o vento com o colchão, passei 10 horas, cerca de 700 km.
Foi ai que questionei a minha existência e a minha sorte no auge dos meus quase 44 anos. Meus miolos mal podiam filosofar com os trancos e porradas dos pneus no asfalto mal conservado, quase inexistente.
Me imaginei um refugiado, um seqüestrado, um recruta fugindo do “front”ou um miserável “chapa” de caminhão tentando um destino qualquer...
De ninguém, a não ser uma tímida iniciativa do Alberico, veio solidariedade, o extremo oposto do Maurino e daquele que nos rebocou quando quebramos.
Às 2 horas da manhã, quatorze horas depois de sairmos, chegamos em Santa Helena. Lá deveríamos deixar peixes e bagagens na casa do irmão do Sebastião. Ali, na casa dele, “implorei” um banho e ressuscitei de novo para a vida. Consegui encostar num sofá (não oferecido) e cochilei umas 3 horas. Fui acordado pelo ronco doentio do Cidão que no chão do alpendre resfolegava. Tomamos um café e como os demais não chegavam tivemos de continuar a viagem para não perder os peixes. De novo, preocupado agora com o Sancho, vim na cabine com uma nesga de bunda no banco e os joelhos apoiados no chão.
Foram 100 km até aqui, Bom Jesus, onde escrevo às 19 horas no hotel Diplomata. Liguei 3 vezes em Santa Helena e até 15 horas não tinham chegado. Com o carro pronto, desde 8 horas da manhã não pude seguir viagem. Almocei na casa do Maurino. Ficaram meus amigos. O conserto do carro ficou em CR$2.700,00 mais ou menos. Cerca de 500 dólares hoje. A despesa toda até agora – mais ou menos CR$3.900,00. Às 8:30 horas vou ligar de novo para Santa Helena. Que o Bom Jesus permita que tudo dê certo daqui pra frente...

Obs.: Chegaram às 11 horas da noite. Todos bem, felizmente. A viagem até Araxá não teve incidentes e lá chegamos por volta de meio dia do dia seguinte. Prometi a mim mesmo que voltaria a Barão de Melgaço: Com camisa de seda, de sapato polido e de avião, e não carregaria nem minha mala para dentro de uma suíte refrigerada de algum hotel fazenda nas proximidades de Barão de Melgaço.
E isso se concretizou, exatamente assim no dia 26 de maio de 2000.

(Esta carta foi escrita em um papel de embrulho de farmácia e enrolada como se fosse um pergaminho)